Com cantos, instrumentos e danças, representantes das 272 vítimas fatais ajudaram a produzir o item cultural com Guardas de Moçambique, durante Oficina de Construção de Memória, em Brumadinho.
Brumadinho, 23 de novembro de 2023 – A luta por justiça pelas 272 vítimas do rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho, ganhou uma forte aliada no último final de semana, durante a Oficina de Construção de Memória, realizada pelo projeto Legado de Brumadinho*. Uma bandeira das Guardas de Moçambique símbolo de proteção do congado mineiro, foi confeccionada especialmente em apoio aos familiares, e será entregue oficialmente a eles durante o próximo dia 25, no ato mensal por justiça e memória das vítimas, organizado pela AVABRUM (Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão-Brumadinho).
As Guardas de Moçambique são grupos afro-religiosos que fazem parte do tradicional congado de Minas Gerais. No dia 19 de novembro, a Oficina buscou fortalecer e ampliar as vozes dos familiares. Os representantes das guardas de Nossa Senhora Aparecida de Mário Campos, Treze de Maio do bairro Concórdia, de Piedade do Paraopeba, do bairro Santa Efigênia e da Comunidade Quilombola de São José se reuniram com as diretoras da AVABRUM Maria Regina da Silva e Josiane Melo, para a confecção coletiva da bandeira das 272 vítimas.
Com cantos, danças, batidas e expressões de fé, a produção foi coordenada pelas artesãs Amanda Bibiano e Fernanda Ribeiro, que fazem parte da Guarda de Moçambique da Guarda de Moçambique de Nossa Senhora do Rosário do bairro Santa Efigênia, em Brumadinho. Na montagem, foram confeccionadas 272 estrelas de fuxico, artesanato feito com pano, nas cores azuis e lilás representando todas as vítimas do rompimento, e também três estrelas vermelhas, em formato maior, simbolizando os não encontrados. Além disso, cada grupo também produziu para o próprio movimento um estandarte, que é uma mini bandeira, em memória das 272 vítimas do colapso.
“A bandeira para nós, no sentido da fé, é a nossa guia. E é por isso que ela vai na frente, para nos proteger. Por isso estamos confeccionando essa bandeira hoje, para guiar e proteger a luta dos familiares. A representação do fuxico vem em forma de estrelas. O céu é muito longe, mas hoje ele se faz presente aqui”, disse Amanda Bibiano. Passada de geração em geração, a bandeira para as Guardas de Moçambique, além de simbolizar legado e proteção, é também uma forma de deixar viva as memórias dos ancestrais.
A cerimônia de confecção coletiva da bandeira foi realizada em uma manhã ensolarada de fé e emoção. Durante o encontro, Maria Regina e Josiane falaram sobre as lutas da AVABRUM por justiça; encontro de Maria de Lurdes Bueno, Nathália Araújo e Tiago Silva, as 3 vítimas ainda não localizadas; memória; direitos dos familiares e não repetição do crime. Elas contaram aos grupos os diferentes conflitos que vivem desde o dia 25/01/2019, dia da tragédia, e pediram para os presentes repassarem a história para frente.
“No nosso país, a gente sabe que para as grandes tragédias, grandes crimes, há muita falta de justiça, e as pessoas acabam esquecendo. Então, nós temos que falar pelos nossos, nós temos que ser voz das 272 pessoas que foram covardemente caladas”, disse Josiane Melo, que perdeu a irmã Eliane Melo grávida de 5 meses no tragédia-crime da Vale.
Também em discurso, Maria Regina, mãe de Priscila Elen Silva, que trabalhava na mineradora, falou sobre a injustiça e a dor da tragédia. “A única certeza que nós temos dessa vida é a morte, mas da forma que aconteceu foi muito injusto. Eles estavam jurados de morte e não tiveram escolha de se defender. Eu tenho certeza que se minha filha e os outros soubessem que estavam em risco, não estariam lá”, afirmou.
Confeccionada no último domingo, a bandeira será apresentada aos demais familiares no próximo sábado, no ato do dia 25/11/23, mensalmente realizado para homenagear as 272 vítimas fatais. Com participação dos representantes das Guardas de Moçambique, o item será oficialmente entregue para AVABRUM.