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2192 dias sem justiça: ato da AVABRUM em Brumadinho lembra vítimas da tragédia-crime da Vale com emoção e luta

DIRETORIA AVABRUM

DIRETORIA AVABRUM

Brumadinho se encheu de dor, lembrança e resistência no último sábado, 25 de janeiro de 2025, quando completaram-se seis anos desde o rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, que ceifou 272 vidas, sendo duas ainda por nascer, e despejou 13 milhões de metros cúbicos de lama na bacia do rio Paraopeba, devastou famílias e marcou para sempre a cidade mineira e o entorno. Pela sexto ano consecutivo, a Associação dos Familiares das Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem (AVABRUM) reuniu centenas de familiares e amigos das vítimas para lembrar das vidas perdidas, renovar o grito de justiça e garantir que a tragédia-crime que aconteceu em Brumadinho e região não seja esquecida e nunca mais se repita.

Às 12h28, o exato momento em que a barragem se rompeu, 2.192 balões foram soltos ao céu, cada um representando um dia sem respostas, sem justiça, sem alívio. Do ato, que é repetido mensalmente, seguiu-se a leitura de cada um dos 272 nomes das vítimas da tragédia, acompanhado de um emocionado “Presente” pelos participantes. Seis anos depois, é possível sentir a dor que ainda persiste nas famílias que perderam seus entes queridos, mas no meio de tantas lágrimas, o sentimento era claro: a luta não pode parar, afinal, nenhum dos responsáveis foi punido criminalmente até hoje.

“Eu perdi o meu marido, Everton Lopes Ferreira, de 32 anos. Perdi o meu cunhado, Tiago Silva Barbosa, de 30 anos. Com ele foi o irmão dele, Denilson. Muito se fala de reparação, mas nós sabemos que para a morte não há reparação. O que nós perdemos não volta mais, e por isso que aconteceu não pode ficar do jeito que está, afinal, os nossos foram pessoas muito queridas que foram embora, pessoas que faziam diferença nos seus lares. É por isso que nós estamos aqui, nós não vamos deixar que apaguem a memória dos nossos”, desabafou a presidente da AVABRUM, Nayara Porto.

Ela destacou a luta de toda a diretoria da associação que representa mais de 370 familiares das vítimas por justiça e respeito à memória das joias, e que seguirão firme até que os culpados sejam punidos. “Até aqui foi muita luta, mas vamos continuar firmes, porque enquanto não houver justiça, nós seguiremos. O que nos une é muito mais forte do que o que pode nos separar, o que nos une é dar voz às 272 joias que foram perdidas, que foram assassinadas naquele dia 25 de janeiro de 2019”, disse.

 

Memória Irreparável

Ao lado da praça “Saudade das Joias”, uma estrutura foi montada para receber os participantes, que chegavam também das romarias realizadas na cidade e no entorno, trazendo a imagem da  Nossa Senhora da Abadia da Água Suja, em peregrinação por justiça socioambiental e memória pelos seis anos do desastre-crime da Vale, padroeira das comunidades atingidas pela mineração. O coral Chita Chic Raízes também se apresentou aos familiares.

O ato foi marcado pela emoção e pela força. O tema deste ano, “Memória Irreparável – uma tragédia que rompeu histórias não será esquecida”, ressoou com a determinação das famílias, que não permitem que o que aconteceu seja esquecido, e para que nunca mais se repita. Cada balão lançado ao céu representava mais do que um simples número. Era uma vida, uma história, uma perda que nunca será superada.

A dor ainda é visível no rosto dos familiares. Pais que não podem abraçar seus filhos, cônjuges que perderam seus companheiros, filhos que ficaram sem pais. Cada um carrega a marca da tragédia-crime de forma diferente, mas todos têm algo em comum: a esperança de que, um dia, a justiça será feita.

O crime da Vale também abarcou famílias de outras cidades. Helena Taliberti, de São Paulo, perdeu seus dois filhos, Camila e Luiz Taliberti, de 33 e 31 anos; a nora, Fernanda Damian, de 30 anos, grávida de cinco meses; o ex-marido, Adriano da Silva, de 61 anos; e a esposa dele, Maria Lourdes Bueno, de 58 anos. Ela veio a Brumadinho participar do ato e da inauguração do Memorial e destacou que  a luta por memória e por justiça continua.

Com a voz embargada, mas firme, ela disse: “Nós viemos para estar todos juntos, para estar junto com as famílias, não havia outro lugar para estar hoje.  Foi aqui que eles estavam juntos, que todos eles foram embora juntos. Todo mundo precisa saber o que aconteceu e o que acontece com as comunidades, as pessoas, os familiares que foram atingidos por essa tragédia.”

Eder Reinaldo Miranda, que perdeu o irmão e o primo na tragédia, estava presente no ato e não escondia a tristeza de como o rompimento da barragem mudou a vida de todos, de uma hora para outra. “Todos os dias são um recomeço de dor, de espera”, diz. Morador do bairro Cohab, ele destacou que a vida de todos foi afetada de forma muito triste. “Foram várias vítimas no bairro onde eu moro e lá nem é o lugar que vemos mais essas perdas. Além disso, a vida da família toda é afetada. Meu sobrinho, por exemplo, até hoje tem dificuldades para sair de casa”, desabafou.

“Meu filho tinha 41 anos quando morreu, ele se chamava Renato Rodrigues Maia. Eu carrego uma tristeza, e isso não sai de ninguém não, porque nós, familiares, não esquecemos. Todos os anos eu venho, eu e meu marido”, disse a senhora Patrocínia Rodrigues Maia, que destacou que a tragédia modifica toda a dinâmica familiar e afeta a todos.

A luta de Brumadinho é um reflexo do que acontece quando as tragédias são tratadas como números, sem a devida responsabilidade. Cada vida perdida é única, e a luta por justiça também. Os familiares sabem que, enquanto não houver resposta, não haverá descanso.

Alexandra Andrade, da diretoria da AVABRUM, que perdeu o irmão, Sandro Andrade Gonçalves, e o primo, Marlon Rodrigues Gonçalves,  falou sobre a importância da luta e pediu que a reparação proposta pela Vale seja executada com mais agilidade.

“São seis anos de uma tragédia-crime que a Vale e a TÜV Süd sabiam que aconteceria, e até hoje a gente não vê ninguém punido, não vê as empresas responsabilizadas. Eu falo que as nossas vidas foram mudadas da pior maneira possível, e por uma coisa que poderia ter sido evitada. A própria reparação, o acordo já foi assinado há muito tempo, e a gente vê muita coisa chegando lentamente. E a cada demora, é como se arrancassem uma casquinha da nossa ferida”, disse.

 

Participação

Após a leitura dos nomes, foi feita uma homenagem ao Corpo de Bombeiros Militares de Minas Gerais, com a presença de membros da corporação, e também do deputado federal, Pedro Aihara, que foi o porta-voz durante o resgate das vítimas do rompimento.

Em nome de todos as autoridades políticas que estavam presentes no ato, a Ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania, Macaé Evaristo, destacou que o governo e a sociedade devem cobrar para que tragédias como essa nunca mais se repitam. “Que a gente não silencie nem um dia, todos os dias de luta para que a verdade seja estabelecida. A gente tem que dizer para as empresas que nossas vidas valem mais, que nenhuma vida pode ser descartada em função do lucro, da exploração da sua vida, e que a gente tem que cuidar de cada pessoa e cuidar do nosso planeta”, disse.

 

 

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