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Para OEA, há impunidade total em grandes tragédias brasileiras

DIRETORIA AVABRUM

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Em audiência na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos, representantes das vítimas de Brumadinho, Mariana, Maceió, Boate Kiss e Ninho do Urubu denunciaram negligências do Estado e a falta de responsabilização penal para os culpados. Até hoje, ninguém foi preso.

 

 

Brumadinho, 17 de julho de 2024 – Na busca por justiça, organizações que representam grandes tragédias brasileiras recentes denunciaram na última sexta-feira,12 de julho, em uma audiência na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA), as diversas negligências que envolvem os casos. Após ouvir o relato de representantes de vítimas das tragédias, a presidente da CIDH, Roberta Clarke, ressaltou que há impunidade nos casos. Até hoje,
ninguém foi responsabilizado por esses crimes.

“Existe uma certa impunidade total, não só penal, mas também civil. Parece haver lacunas imensas nesses casos. É uma falha na aplicação da lei”, afirmou a representante da OEA, organização que representa 34 países e é o principal fórum político, jurídico e social das Américas. Com base na audiência, a CIDH pode fazer recomendações ao governo brasileiro e até levar o caso à Corte Interamericana de Direitos Humanos. As decisões são de cumprimento obrigatório.

 

Denúncias e perseguições

A audiência foi convocada para debater as responsabilidades pelas violações de direitos humanos causadas por atividades comerciais. Os representantes das vítimas pediram à comissão que instrua o Estado brasileiro a instaurar ou reabrir processos penais e administrativos contra os agentes públicos que atuaram nesses casos. Eles ainda denunciaram a morosidade das ações penais e a perseguição de vítimas e familiares que se opõem aos processos de reparação ou mesmo reclamam da justiça comum.

“Para as organizações presentes, foi uma audiência excepcional e, também, emocional. A própria presidente da CIDH falou sobre a importância de as vítimas estarem ali, pois fez toda a diferença. Os comissários também falaram que ainda não houve responsabilização para os casos e ficou muito claro que as vítimas têm sido perseguidas e retaliadas”, disse a advogada Tâmara Biolo Soares, que representou as associações na audiência.

Participaram do encontro representantes das vítimas dos rompimentos das barragens da Vale, em Brumadinho (2019), e da Vale e da BHP, em Mariana (2015); do afundamento causado pela Braskem com a exploração do subsolo em Maceió (2018); e dos incêndios da Boate Kiss (2013) e do alojamento Ninho do Urubu, do Flamengo, no Rio de Janeiro (2019). Juntas, essas tragédias mataram 544 pessoas, deixaram centenas de milhares de sobreviventes com sequelas físicas e emocionais graves e ainda marcaram com dor, indignação e revolta famílias inteiras – centenas precisaram se mudar ou ficaram desalojadas – e comunidades.

Fizeram exposições integrantes da Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão-Brumadinho (AVABRUM), da Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM), da Associação Quilombola Vila Santa Efigênia e Adjacências – Mariana/MG, a Associação de Movimento Unificado das Vítimas da Braskem (MUVB), da Associação dos Familiares de Vítimas do Incêndio do Ninho do Urubu (AFAVINU), do Movimento
pela Soberania Popular na Mineração (MAM) e a da Comissão de Atingidos pela Barragem de Fundão (CABF).

 

‘Multas não seguram barragens’

Sobre as declarações de representantes do Estado brasileiro, que afirmaram que, após as tragédias, multaram as corporações envolvidas, a diretora da AVABRUM, Josiane Melo, rebateu: “Incrível que organizações que deveriam garantir a segurança e a justiça no caso de rompimento de barragens achem que apenas aplicar multas e sanções às empresas é suficiente. Multas não seguram barragens e não salvam vidas. É preciso garantir um sistema mais rigoroso de fiscalizações e de forma independente”, afirmou Josiane Melo, acrescentando que, tanto em Mariana quanto Brumadinho, as barragens que romperam tinham o laudo de estabilidade emitido por empresas certificadoras e entregues aos órgãos competentes. “Está claro que existe uma ineficiência neste processo de fiscalização”.

Josiane ainda lembrou que os familiares e vítimas nunca foram ouvidos nos acordos de reparação que o Estado fez com as corporações. “É preciso construir acordos que possam amenizar os impactos com a participação direta dos atingidos. É preciso trazer a Justiça e a condenação das empresas e pessoas indiciadas. Só assim os familiares terão alento e poderão seguir suas vidas”, completou Josiane Melo, que perdeu a irmã grávida na tragédia-crime de Brumadinho.

 

‘No Brasil, pessoas com poder não vão presas’

“Essas tragédias denunciam práticas sistemáticas e violadoras de direito no Brasil. Infelizmente, aqui, empresários e grandes executivos são blindados pela justiça e pelo processo penal. No Brasil, pessoas com poder não vão presas. Em nenhum desses casos há qualquer autoridade pública respondendo por sua atuação. Não porque não haja responsabilidade, mas sim porque foram excluídos do escrutínio judicial”, apontou Tâmara.

A audiência foi transmitida ao vivo pelo canal do YouTube da CIDH, e pode ser vista aqui.

 

 

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